A ideia é redentora: nos dê
subsídios fiscais e toda a sua economia ficará mais competitiva! Pobre do
gestor público que ignorar essa síntese teórica, pois será testemunha da
própria derrocada por conta da revoada de investimentos privados para estados com
políticas fiscais mais “competitivas”.
Nada mais fácil e confortável
que defender uma “agenda competitiva” envolvendo súplicas especiais para
concessão de benesses fiscais, que é razoavelmente justificada pela necessidade
de emprestar competitividade a nossas empresas para concorrerem com outras,
sediadas em outros estados. Afinal, competitividade é circunstância que só agrega,
certo?
Errado, pois isso não é
competição, é guerra! Defender a competição entre empresas por meio de um
sistema fiscal-tributário mais favorável, com raras exceções, dissimula um
elaborado plano para concentrar ainda mais riqueza no andar de cima.
Ser empresarialmente
competitivo por conta de subsídios fiscais é o mesmo que construir o próprio
telhado (privado) com telhas retiradas de casas vizinhas (público). As telhas vão
fazer falta cedo ou tarde, e isso provavelmente vai ser percebido no pior
momento possível.
Bons empresários não fazem
investimentos com base no código tributário ou negócios por conta de subsídios
fiscais. Essa foi a mensagem transmitida pelo o ex-presidente da gigante
mundial do alumínio Alcoa, Paul O’Neill, por ocasião de sua sabatina antes de
assumir a função de secretário do tesouro dos EUA, em 2001.
A mensagem de O’Neill é
corroborada por estudos realizados por respeitados organismos nacionais e
internacionais, como o brasileiro Centro de Liderança Pública e o suíço Fórum
Econômico Mundial, que, respectivamente, são os idealizadores do ranking da
competitividade dos estados brasileiros e das maiores economias do mundo.
O ranking da competitividade
patrocinado pelos citados organismos se utiliza de pilares e indicadores que
mensuram a capacidade que os governos têm de preparar sua economia para receber
e manter um mercado competitivo e produtivo.
O Fórum Econômico Mundial, por
exemplo, produz seu índice de competitividade anualmente para 144 países,
baseando-se em 12 "pilares" da competitividade, são eles:
instituições, infraestrutura, tecnologia, estabilidade macroeconômica, saúde,
educação, trabalho, mercado de produtos, sistema financeiro, dinâmica
empresarial e inovação. Esses pilares se desdobram em 98 indicadores.
Chama atenção um pilar em
particular, o de “mercado de produtos”, que curiosamente possui um indicador
que mensura o grau de distorção concorrencial causado por subsídios e
benefícios fiscais. Quanto maior a incidência de subsídios, menor a nota nesse
indicador.
Em 2018 o Brasil ficou em 72°
lugar no ranking geral da competitividade do Fórum Econômico Mundial, e na 132ª
posição no indicador de distorções por subsídios fiscais.
O fraco desempenho brasileiro no ranking do
Fórum Econômico Mundial surpreende ainda mais quando se constata que o país
ocupa a 10ª posição no pilar “tamanho do mercado” e a 8ª colocação quando o
indicador trata do respectivo PIB.
Porém, existe uma explicação
lógica para a pífia posição da grandiosa economia brasileira no ranking da
competitividade: as telhas retiradas das casas vizinhas fizeram falta.
A maioria dos pilares que
compõem o ranking dependem fortemente de investimento público (telhas), que
foram desviados para atender o interesse de poucos, porém poderosos, nichos
empresariais.
Para empreender com qualidade
e segurança, além de capital próprio e know-how suficiente para iniciar o negócio,
é necessário que o estado proporcione ao empreendedor um ambiente
economicamente previsível e estável, dispondo de uma força de trabalho saudável
e instruída, oferecendo ainda uma infraestrutura razoável. É essa, e tão somente essa, a
parte que cabe ao estado investir no fomento da competitividade.
Óbvio que a renúncia de
receita pública em favor de particulares mitiga ou inviabiliza investimentos
públicos em saúde, educação, segurança e obras de infraestrutura, fator que
deteriora o ambiente competitivo que o estado deveria oferecer aos empresários
que comungam da opinião de Paul O’Neill, esses sim, empreendedores autênticos.
Embora a competitividade possa
ser artificialmente aumentada através da política de renúncia fiscal, trata-se
de uma escolha com efeitos efêmeros, que resolve um problema a curto prazo,
porém, cria diversos outros a médio e longo prazo. Uma hora as telhas farão falta, lembram-se?
Assim, quando toleramos que
tributos sejam renunciados pelo estado atendendo apelos ou ameaças de grupos
restritos de empresários viciados em benesses fiscais, que pregam o caos social
e econômico caso a fonte ameace mirrar, não fazemos em nome da competitividade,
mas sim por conta de um falso conjunto de crenças e lendas fiscais que são
encorajadas e difundidas por poderosas corporações e seus lobistas associados.
A verdadeira competitividade é
aquela que oferece a concreta possibilidade de crescimento econômico
sustentável e inclusivo, possibilitando que toda a sociedade (repito: toda a
sociedade!) se beneficie dos frutos desse crescimento.
A posição do Brasil no ranking
da competitividade mundial demonstra claramente que estamos seguindo o caminho
errado.