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quarta-feira, 13 de maio de 2020

Prioridade não tem plural. Receita ou Tesouro?

Prioridade não tem plural

Em janeiro de 2019, pela primeira vez, a despesa tomou o lugar da receita no coração da principal secretaria do Estado. Agora chamada de Economia, a prioridade da pasta passou a ser o Tesouro, área que os novos gestores da antiga Fazenda acreditam ser o carro-chefe que afastará Goiás da crise fiscal.


Isso, não tanto pela função do Tesouro de controlar despesas correntes, mas especialmente por essa área administrar o endividamento do Estado, assessorando o governo na contratação de novos empréstimos ao mesmo tempo em que busca meios de postergar dívidas antigas e outras obrigações financeiras que entendem inconvenientes.


Tudo bem, não fosse a fixação dos gestores da Economia pelas atribuições do Tesouro, passionalidade que fez muito mais que transmudar o papel de protagonista da Receita estadual para o de coadjuvante, fez com que esse papel raramente exceda o de mero figurante.


Sucateamento da T.I. fazendária; delegacias fiscais empurradas para locais e espaços inapropriados; CAT prestes a ser espremido em ¼ (um quarto) de um dos blocos da sede da Economia (regredimos aos anos 90); a comédia do open space; aceleração de aposentadorias (já se foram 103 auditores, com mais 24 na fila), enquanto 118 aprovados no último concurso aguardam ansiosamente pela nomeação.


São apenas alguns exemplos do apontado descaso, justificado com a retórica econômica da retomada do “equilíbrio” fiscal. Todavia, não tem existido equilíbrio na pasta da Economia, o que existe ali é uma prioridade.


Prioridade no singular, na perspectiva semântica da palavra, que não tem plural.


Diferentemente da economia esperada, a consequência do tratamento desigual entre setores tão importantes da máquina pública possui um custo, alto.


A notícia é de queda vertiginosa das ações fiscais promovidas por auditores-fiscais nos últimos 12 meses. Uma diminuição na presença fiscal maior que 50%. Na fiscalização de fronteiras e mercadorias em trânsito noticia-se queda ainda maior, 70%.


Historicamente, entre 4% e 5% da arrecadação tributária estadual tem origem em autos de infração lavrados pelo fisco, rendendo ao erário cerca de R$ 1 bilhão ao ano. Confirmada a queda da presença fiscal, se nada for feito, a redução da receita direta produzida por autos lavrados pelo fisco pode chegar a R$ 250 milhões até o final do ano.


Porém, o maior prejuízo ao erário com o enfraquecimento do fisco ocorre de forma indireta, uma vez que a diminuição da atividade repressiva/punitiva do Estado - em qualquer área - conduz fatalmente à diminuição da percepção de risco do administrado. 


É empírico, a diminuição da percepção do risco fiscal faz o nível de inadimplência crescer dentre o grupo de bons contribuintes e o nível de sonegação disparar no grupo dos maus contribuintes. Para piorar, a redução dessa percepção ocorre a curto e médio prazo, enquanto sua recuperação é lenta e sofrida.


Assim, o encolhimento da presença do fisco não corrói somente os cerca de 5% que as autuações fiscais representam no total da arrecadação estadual, corrói também os outros 95% da receita tributária (cerca de R$ 20 bilhões), oriunda da espontaneidade do contribuinte.


Não encontrando mais espaço na pasta da Economia, cuja atual gestão não mostra interesse em flexionar sua prioridade, é chegada a hora de a Receita estadual goiana buscar o abrigo que precisa em uma pasta singular.


Uma nova secretaria ou autarquia integralmente dedicada à arrecadação, tributação, fiscalização, guarda de informações fiscais, contencioso e cobrança administrativa. Conduzida por expert na área nomeado e subordinado diretamente ao chefe do Executivo.


Dessa forma, receita e despesa pública podem ser tratadas com a prioridade que cada uma realmente precisa, cada qual em seu lugar.


A Receita estadual não só merece como necessita muito dessa mudança, para o bem da arrecadação, para o bem de Goiás.


sexta-feira, 14 de junho de 2019

O telhado da competitividade


A ideia é redentora: nos dê subsídios fiscais e toda a sua economia ficará mais competitiva! Pobre do gestor público que ignorar essa síntese teórica, pois será testemunha da própria derrocada por conta da revoada de investimentos privados para estados com políticas fiscais mais “competitivas”.

Nada mais fácil e confortável que defender uma “agenda competitiva” envolvendo súplicas especiais para concessão de benesses fiscais, que é razoavelmente justificada pela necessidade de emprestar competitividade a nossas empresas para concorrerem com outras, sediadas em outros estados. Afinal, competitividade é circunstância que só agrega, certo?

Errado, pois isso não é competição, é guerra! Defender a competição entre empresas por meio de um sistema fiscal-tributário mais favorável, com raras exceções, dissimula um elaborado plano para concentrar ainda mais riqueza no andar de cima.

Ser empresarialmente competitivo por conta de subsídios fiscais é o mesmo que construir o próprio telhado (privado) com telhas retiradas de casas vizinhas (público). As telhas vão fazer falta cedo ou tarde, e isso provavelmente vai ser percebido no pior momento possível.

Bons empresários não fazem investimentos com base no código tributário ou negócios por conta de subsídios fiscais. Essa foi a mensagem transmitida pelo o ex-presidente da gigante mundial do alumínio Alcoa, Paul O’Neill, por ocasião de sua sabatina antes de assumir a função de secretário do tesouro dos EUA, em 2001.

A mensagem de O’Neill é corroborada por estudos realizados por respeitados organismos nacionais e internacionais, como o brasileiro Centro de Liderança Pública e o suíço Fórum Econômico Mundial, que, respectivamente, são os idealizadores do ranking da competitividade dos estados brasileiros e das maiores economias do mundo.

     O ranking da competitividade patrocinado pelos citados organismos se utiliza de pilares e indicadores que mensuram a capacidade que os governos têm de preparar sua economia para receber e manter um mercado competitivo e produtivo.

O Fórum Econômico Mundial, por exemplo, produz seu índice de competitividade anualmente para 144 países, baseando-se em 12 "pilares" da competitividade, são eles: instituições, infraestrutura, tecnologia, estabilidade macroeconômica, saúde, educação, trabalho, mercado de produtos, sistema financeiro, dinâmica empresarial e inovação. Esses pilares se desdobram em 98 indicadores.

   Chama atenção um pilar em particular, o de “mercado de produtos”, que curiosamente possui um indicador que mensura o grau de distorção concorrencial causado por subsídios e benefícios fiscais. Quanto maior a incidência de subsídios, menor a nota nesse indicador.

     Em 2018 o Brasil ficou em 72° lugar no ranking geral da competitividade do Fórum Econômico Mundial, e na 132ª posição no indicador de distorções por subsídios fiscais.


    O fraco desempenho brasileiro no ranking do Fórum Econômico Mundial surpreende ainda mais quando se constata que o país ocupa a 10ª posição no pilar “tamanho do mercado” e a 8ª colocação quando o indicador trata do respectivo PIB.

Porém, existe uma explicação lógica para a pífia posição da grandiosa economia brasileira no ranking da competitividade: as telhas retiradas das casas vizinhas fizeram falta.

A maioria dos pilares que compõem o ranking dependem fortemente de investimento público (telhas), que foram desviados para atender o interesse de poucos, porém poderosos, nichos empresariais.

Para empreender com qualidade e segurança, além de capital próprio e know-how suficiente para iniciar o negócio, é necessário que o estado proporcione ao empreendedor um ambiente economicamente previsível e estável, dispondo de uma força de trabalho saudável e instruída, oferecendo ainda uma infraestrutura razoável. É essa, e tão somente essa, a parte que cabe ao estado investir no fomento da competitividade.

Clique para acessar o ranking
  Óbvio que a renúncia de receita pública em favor de particulares mitiga ou inviabiliza investimentos públicos em saúde, educação, segurança e obras de infraestrutura, fator que deteriora o ambiente competitivo que o estado deveria oferecer aos empresários que comungam da opinião de Paul O’Neill, esses sim, empreendedores autênticos.

Embora a competitividade possa ser artificialmente aumentada através da política de renúncia fiscal, trata-se de uma escolha com efeitos efêmeros, que resolve um problema a curto prazo, porém, cria diversos outros a médio e longo prazo. Uma hora as telhas  farão falta, lembram-se?

Clique para acessar o ranking
   Assim, quando toleramos que tributos sejam renunciados pelo estado atendendo apelos ou ameaças de grupos restritos de empresários viciados em benesses fiscais, que pregam o caos social e econômico caso a fonte ameace mirrar, não fazemos em nome da competitividade, mas sim por conta de um falso conjunto de crenças e lendas fiscais que são encorajadas e difundidas por poderosas corporações e seus lobistas associados.

A verdadeira competitividade é aquela que oferece a concreta possibilidade de crescimento econômico sustentável e inclusivo, possibilitando que toda a sociedade (repito: toda a sociedade!) se beneficie dos frutos desse crescimento.

A posição do Brasil no ranking da competitividade mundial demonstra claramente que estamos seguindo o caminho errado.

Tomaremos o rumo correto quando começarmos a impedir que nossas telhas sejam desviadas para cobrir o telhado vizinho.



https://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,forum-dos-leitores,70002874799


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segunda-feira, 10 de junho de 2019

Quando quiserem saber sobre fiscalização e arrecadação perguntem ao fisco

Na semana que passou o deputado estadual Claudio Meirelles concedeu entrevista afirmando que “a arrecadação está caindo”, sem, contudo, apresentar dados sobre tal queda.

Primeiramente, compete-nos consignar que o nobre deputado se encontra afastado há cerca de duas décadas dos quadros da antiga Secretaria da Fazenda, e, importante frisar que o mesmo pertence ao quadro auxiliar administrativo da pasta fazendária, estranho, por tal, aos quadros do fisco estadual.

Tais circunstâncias podem explicar, em parte, o show de desinformação sobre o funcionamento da máquina fazendária estadual patrocinada pelo parlamentar em sua entrevista, em especial sobre os números da arrecadação.


Exemplo da incongruência verberada pelo deputado é o levantamento do SINDIFISCO efetuado junto aos auditores-fiscais da pasta da Economia, demonstrando que o Estado de Goiás, de janeiro a maio deste ano (2019), arrecadou mais de R$ 8 bilhões em tributos. São R$ 783 milhões arrecadados a mais do que o mesmo período do ano passado, o que representa um aumento de 10,8% na receita tributária.
À exceção do ITCD que teve uma queda de R$ 1,2 milhão no mesmo período do ano anterior, algo em torno de 1% de decréscimo, todos os demais tributos estaduais apresentaram acréscimo real na respectiva arrecadação.


Os auditores-fiscais consultados esperam fechar o primeiro semestre com um acréscimo de arrecadação perto R$ 1 bilhão em comparação ao ano anterior, fruto de um trabalho técnico e qualificado, que foca na tecnologia e inteligência fiscal para identificar gargalos, e com isso direcionar os agentes do fisco a nichos concretos de evasão fiscal, dando efetividade e eficiência, tanto na prevenção quanto no combate à sonegação.


Métodos bem diferentes, portanto, dos defendidos pelo nobre deputado Cláudio Meirelles, que ainda acredita em abordagens aleatórias e genéricas, efetuadas por comandos fixos e móveis, que até poderiam fazer sentido na época em que o deputado auxiliava os trabalhos do fisco décadas atrás, mas que aos poucos vem sendo abandonados pelas administrações tributárias brasileiras, em especial pelas mais desenvolvidas.


A nota fiscal eletrônica é o exemplo mais pulsante dessa nova era de tecnologia e inteligência na fiscalização tributária.

Bom entender de vez, por mais saudoso que seja, que já faz muito tempo que o famoso “zero quatro” não é mais a principal ferramenta na fiscalização do ICMS em Goiás. Evoluímos.

Fica a lição: toda a vez que quiserem saber sobre fiscalização e arrecadação perguntem ao fisco, evitando assim constrangimentos.

sexta-feira, 22 de março de 2019

Operação fiscal “Grãos II”, rende prisão em flagrante e identifica fraudadores


Batalhão Fazendário e COD (prisão em flagrante)
A Gerência de Arrecadação e Fiscalização (GEAF) da Secretaria de Economia (antiga SEFAZ), deflagrou nos dias 20 e 21 últimos, a Operação Grãos II, tendo como principal objetivo identificar os responsáveis pela evasão fiscal de parte da safra goiana, com especial atenção nas commodities do milho e da soja.

Auditores-Fiscais em trabalho noturno
Segundo o Gerente da GEAF, Luciano Pessoa, com a identificação da real origem e destino dos grãos, e dos intermediários que promovem a comercialização irregular dessas mercadorias, será possível desdobrar e planejar operação fiscal ainda maior, contando com mandados judiciais de busca, apreensão e prisão dos operadores da fraude fiscal, sequestrando-lhes os bens e valores adquiridos com o delito de sonegação fiscal, além da responsabilização criminal por falsidade , lavagem de dinheiro e organização criminosa.

A operação durou dois dias e uma noite, e foi desenvolvida nas fronteiras sul, sudeste e norte de Goiás, com bases de fiscalização nas cidades de Catalão, Goiás, Goianésia, Iporá, Rio Verde, Jataí e Itumbiara, onde foram abordados mais de 1.000 veículos, lavrados 50 autos de infrações e arrecadados cerca de R$ 350 mil em ICMS e multas.

Auditores Luciano Pessoa e Bernardo Póvoa
Gerente e Supervisor da GEAF
A operação fiscal contou com o apoio do Batalhão Fazendário (BPMFaz/CPR) e do Comando de Operações de Divisas (COD/CPR), ocasião em que os policiais militares também realizaram abordagens visando flagrar infrações de cunho penal.

Cigarros contrabandeados apreendidos
Um dos flagrantes realizados foi a interceptação na barreira de Chapadão do Céu na GO-050, de uma carreta bitrem carregada de cigarros contrabandeados, que dissimulava o transporte da mercadoria proibida através de nota fiscal inidônea, descrevendo falsamente como mercadoria transportada 38,6 toneladas de arroz em casca, que teriam origem no Rio Grande do Sul e destino a uma cerealista localizada na cidade de Aparecida de Goiânia, levando a crer que os cigarros contrabandeados seriam comercializados na região metropolitana da capital de Goiás.

O motorista da carreta foi preso em flagrante e colocado à disposição da justiça.

Outra situação irregular flagrada pela operação Grãos II, foram nove (9) carretas carregadas de soja que estavam escondidas em uma fazenda. O Delegado Regional de Fiscalização de Jataí, Auditor-fiscal Gerson Segundo, informou que as nove carretas estavam aguardando a operação fiscal terminar para darem prosseguimento a viagem.

A carga não possuía nenhuma documentação fiscal, ficando apreendidas até a identificação do seu real proprietário.

Blitz GO-050
O Supervisor da GEAF, Auditor-fiscal Bernardo Póvoa, explica que os dados e informações colhidas durante a operação serão objeto de análise por parte da Gerência de Fiscalização e Arrecadação, que avaliará a conveniência do seu desdobramento em relação aos destinatários e remetentes das mercadorias irregulares flagradas na “Grãos II”. “Em todo caso, uma terceira etapa da operação ‘Grãos’ já tem data certa para ser deflagrada”, explica.



RESUMO DA OPERAÇÃO GRÃOS II









quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

Auditores-fiscais apreendem mais de 20 caminhões em Itumbiara/GO

Após consultarem o Sindifisco sobre a decisão da assembleia geral de reduzir a produtividade, auditores da Delegacia Fiscal de Itumbiara foram orientados pela entidade sindical a trabalharem normalmente até o dia 11 de março, data marcada para o início do movimento.

Assim, nesta madrugada (28), equipes de fiscalização daquela regional fazendária realizaram blitzen na divisa entre GO e MG, apreendendo mais de 20 caminhões carregados com diversos produtos (sucata, colchões, confecções, fio de algodão), além de oito carretas carregadas com grãos, que era o principal objetivo da operação, totalizando 411.000 Kg de milho sem documentação fiscal. 

As mercadorias apreendidas foram avaliadas em R$ 380 mil, e serão liberadas conforme houver a identificação dos sonegadores envolvidos ou a quitação do imposto e multa correspondente ao ICMS sonegado, calculado em torno de R$ 200 mil reais, fora os desdobramentos dessa ação fiscal sobre os produtores e cerealistas de onde saíram os grãos sem documentação fiscal.

Seis carretas carregadas de grãos apreendidas já estavam sendo monitoradas pelo fisco desde sua origem através da inteligência fiscal, apoiada pelo Batalhão Fazendário e Comando de Operações de Divisa - COD.

Os auditores que realizaram a operação disseram que não apreenderam uma quantidade maior de caminhões devido os membros da equipe já estarem ocupados na abordagem de veículos. “Ocorreram muitas fugas por falta de pessoal e viaturas para perseguirem esses caminhões”, disse um dos Auditores-fiscais.

A partir do dia 11 de março, seguindo a orientação da assembleia geral do Sindifisco, operações como a desta madrugada vão ficar suspensas, como parte da mobilização da categoria de Auditores-fiscais.

Claudio Modesto


sábado, 8 de dezembro de 2018

Photoshop contábil


Prestar contas no exclusivo interesse de satisfazer a própria expectativa, sem, contudo, afetar a credibilidade dos números apresentados, é tarefa inglória. Não à toa a criatividade na contabilização de receitas e despesas quase sempre leva a alguma fraude ou “pedalada” fiscal.
O criacionismo contábil tem por premissa a esquiva do principal objetivo da contabilidade, que é o de fielmente registrar a situação patrimonial e fiscal da entidade. Assim, à luz da ética e da moral, a contabilidade criativa caminha na escuridão, pois, é cega diante princípios elementares da ciência contábil.
A maquiagem de contas contribuiu decisivamente na consolidação do atual quadro de penúria financeira vivenciada pelos estados. A real gravidade do desiquilíbrio entre receita e despesa foi solapada durante anos, graças à boa tolerância que os órgãos de fiscalização e controle têm com a metodologia contábil personalizada utilizada por uma boa parte dos entes públicos, justamente os que, hoje, encontram-se em colapso.
A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) há muito vem acusando a prática da contabilidade criativa e a leniência dos órgãos de controle em relação a essa. Um dos apontamentos do STN revela que no ano de 2017 a maioria dos estados se enquadraram artificialmente em limites prudenciais da lei de responsabilidade fiscal, através da contabilização de percentuais menores de comprometimento da receita corrente líquida (RCL) com a respectiva folha de pagamento.
Goiás, por exemplo, é citado com um furo em torno de 20% em relação ao que declarou. Não obstante a conclusão do STN de que tal diferença foi dissimulada pela contabilidade criativa, o pecado contábil não sofreu penitência ou sermão por parte do pleno do TCE.
Apenas para ilustrar, no final de 2017 a França editou norma que obriga as agências de publicidade destacarem em suas propagandas o termo: “imagem retocada”, no caso da real aparência dos modelos fotográficos for alterada por softwares de edição de imagens. A iniciativa busca minimizar os males que a “ditadura da beleza” provoca no público feminino, perigosamente influenciado pelos perfeitos, porém irreais, corpos e rostos.
Traçando um paralelo com o exemplo europeu, sendo tolerado enfeitar o real resultado da situação patrimonial, fiscal e econômica da entidade, a sinceridade imposta à propaganda francesa é o bom exemplo a ser seguido pela contabilidade brasileira.
Imaginem só os registros contábeis patrimoniais e financeiros trazendo logo na sua abertura, o seguinte aviso: “Cuidado, contabilidade criativa”.
Dez/2018
Cláudio Modesto

Auditor-Fiscal e Diretor Jurídico do SINDIFISCO



terça-feira, 25 de setembro de 2018

A reforma tributária que (não) interessa: a mitomania da simplificação



Quantas vezes já ouvimos que as leis brasileiras são feitas para beneficiar os ricos e/ou prejudicar os pobres? A quantidade de vezes que já ouvi tal assertiva me leva a crer que parte significativa das leis vigentes em nosso país carregam essa estigmatizante mácula.
Leis aparentemente austeras são constantemente mitigadas por subterfúgios jurídicos e atalhos legislativos que normalmente só os endinheirados conseguem trilhar. Isso, talvez, ocorra em razão de os ricos serem detentores ou patrocinadores da quase totalidade dos cargos eletivos do nosso país. Apesar de eticamente questionável, inegável que legislar em causa própria é um privilégio imensurável.
Nessa senda, tudo leva a crer que as leis tributárias brasileiras também foram urdidas para favorecer os ricos e penalizar os pobres.  A obra: A Reforma Tributária Necessária[1]; consolida dados da OCDE e RFB que demonstram com esmerada clareza como o sistema tributário brasileiro é benevolente com os ricos e cruel com os pobres.
Oportuno sintetizar alguns exemplos do altruísmo das leis tributárias brasileiras em relação aos abastados, observem:
     A tributação sobre o consumo, onde o pobre é mais afetado, representa cerca de 50% da carga tributária nacional, e apenas metade disso, cerca de 25% incidem sobre patrimônio (5%) e renda (20%), que pesam mais sobre os ricos;
     Representando menos de 1% da população, os ricos usufruem de  70% de toda a isenção concernente ao Imposto de Renda Pessoa Física - IRPF;
     As alíquotas efetivas do IRPF são progressivas até 40 salários mínimos e regressivas a partir desse patamar, despencando de 12% para 6% quando a renda atinge patamar superior a 160 salários mínimos por mês;
     A alíquota máxima do imposto brasileiro sobre heranças é de 8%; contra 22% da Argentina, 35% do Chile, 40% dos EUA, 50% da Alemanha, 55% do Japão, 60% da França, 64% da Espanha e 80% da Bélgica;
     O comemorado fim da obrigatoriedade da contribuição sindical que financiava entidades representativas dos trabalhadores, não alcançou as contribuições obrigatórias do chamado Sistema “S” (SENAI, SESC, SEBRAE, SENAT e SENAR); que se tratam de entidades patronais dirigidas pelo grande empresariado, cujas atividades são financiadas através da tributação mensal da folha de pagamento das empresas com alíquotas que chegam a 3%;
     Os crimes tributários no Brasil não são de “conduta” mas de “resultado” cuja materialização depende de um intrincado e demorado contencioso administrativo, e, mesmo ao final desse contencioso, há possibilidade de o sonegador ver a sua punibilidade extinta ou suspensa com o pagamento ou parcelamento do débito, que na maioria da vezes ocorre através de programas fiscais de  recuperação que reduzem ou eliminam as multas aplicadas em razão da infração praticada, às vezes o perdão fiscal alcança até mesmo os juros e a correção monetária  incidentes sobre o débito. Trata-se, pois, de um verdadeiro prêmio ao sonegador;
     As grandes empresas conseguem cumular benefícios com incentivos fiscais do ICMS, o que, na prática, chega a reduzir a carga desse tributo estadual para cerca de 1% do faturamento bruto da grande empresa beneficiada. Trata-se de uma carga tributária de ICMS equivalente à que incide sobre microempresas enquadradas na menor faixa de tributação do Simples Nacional, e quase quatro vezes menor caso essa empresa esteja enquadrada na maior faixa do mesmo Simples Nacional;
     Iates, lanchas, Jet Skis, jatinhos e helicópteros; bens duráveis de elevadíssimo valor, não obstante se enquadrarem no conceito de veículo automotor, não sofrem incidência do IPVA;
     Com previsão constitucional desde 1988, 30 anos depois, o Imposto sobre Grandes Fortunas - IGF, ainda não faz parte da agenda tributária do governo federal, sequer havendo nesse tempo um debate razoável sobre o tema por parte do Congresso Nacional.
Outro emblemático exemplo que entendo ser o suprassumo da benevolência tributária que a legislação brasileira dedica aos ricos, é o fato de o Brasil isentar de impostos os lucros e dividendos auferidos pelos ricos. Em todo o planeta, fora o Brasil, somente a Estônia teve a especial gentileza de isentar de impostos o topo da pirâmide social.
Não à toa pesquisadores do Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG), vinculado ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), em sua pesquisa[2] concluíram que:
“[...] o Brasil é um país de extrema desigualdade e também um paraíso tributário para os super-ricos, combinando baixo nível de tributação sobre aplicações financeiras, uma das mais elevadas taxas de juros do mundo e uma prática pouco comum de isentar a distribuição de dividendos de imposto de renda na pessoa física”(grifamos)
Ora, se a lei tributária brasileira atende muito bem as necessidades que os ricos têm de manter e aumentar a própria riqueza, resta entender então por que eles ainda clamam por reformas. A resposta é singela: querem simplificação[3],  transformando o que já é bom em ótimo!
Não estamos aqui criticando a necessidade de simplificação do arcabouço tributário brasileiro, que, em muitos casos, causa embaraços ao próprio fisco. Outrossim, enviar proposta de reforma tributária ao legislativo sem previsão de revisão da perversa lógica de tributar mais o consumo e menos o patrimônio e a renda, apresenta-se socialmente inaceitável.
A simplificação pura e simples seria a infeliz consagração do  problema da tributação brasileira: a injustiça! Chega a ser covarde clamar por reformas para, ao final, preservar o pesado ônus que nossa tributação ocasiona às camadas mais pobres da sociedade, viabilizando assim que os donos da riqueza brasileira continuem a não subsumir seus vultosos rendimentos e patrimônio à tributação progressiva, conforme a respectiva capacidade contributiva.
Doutra banda, quando os autores da proposta de simplificação nua e crua do sistema tributário apegam-se no princípio existente no art. 179 da CF/88[4] - visando estender aos grandes o que a Constituição reserva somente aos pequenos - acabam cometendo outro desserviço social, aprofundando ainda mais a realidade regressiva do nosso sistema tributário.
Isso porque sistemas tributários efetivamente justos e progressivos, que taxam mais quem ganha mais, necessitam de mecanismos de fiscalização e controle mais complexos, tanto para manter a progressividade necessária do sistema, quanto para aferir a capacidade efetiva de contribuição de determinado contribuinte; circunstâncias que vão, curiosamente, na contramão da simplificação almejada pelos ricos.
Destarte, uma reforma que seja minimamente justa deve ir além da mera simplificação do sistema, buscando, sobretudo, reduzir a desigualdade e promover o desenvolvimento social e econômico. Para tal, não basta reduzir bases e alíquotas fiscais, mas principalmente redistribuir a carga tributária para que a lógica da capacidade contributiva, da progressividade e da essencialidade; ganhem real sentido no cotidiano do brasileiro comum.
A diminuição das desigualdades sociais e o desenvolvimento econômico, passam, obrigatoriamente, por uma reforma tributária justa e solidária; que se encontra bem distante da mitomania que carrega a proposta de simplificação defendida no Congresso Nacional por notórios representantes dos ricos.
Devemos, vigorosamente, atacar de frente as incongruências do nosso sistema tributário para, finalmente, viabilizar e fazer valer o Estado Social que os brasileiros merecem, especialmente os mais necessitados.
Setembro/2018

Cláudio Modesto
Auditor-Fiscal da Receita Estadual
Diretor Jurídico do SINDIFISCO/GO



[1] ANFIP. FINAFISCO. A Reforma Tributária Necessária: diagnóstico e premissas. Eduardo Fagnani (organizador). Brasília: São Paulo: Plataforma Política Social, 2018.804P.

[2] Gubetti, Sérgio Wulff ; Orair, Rodrigo Octavio. Tributação e distribuição de renda no Brasil: novas evidências a partir das declarações tributárias de pessoas físicas. International Policy Centre for Inclusive Growth (IPC/ONU), Brasília, 2016.
[3] Medida de simplificação tributária deverá ser encaminhada ao Congresso Nacional,  A proposta prevê o fim da cumulatividade das contribuições sociais do PIS e Confins. Disponível em:  http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/RADIOAGENCIA/554357-MEDIDA-DE-SIMPLIFICACAO-TRIBUTARIA-DEVERA-SER-ENCAMINHADA-AO-CONGRESSO-NACIONAL.html, Acessado em: 25/09/2018
[4] (CF/1988) Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.