Prestar contas no exclusivo interesse de
satisfazer a própria expectativa, sem, contudo, afetar a credibilidade dos
números apresentados, é tarefa inglória. Não à toa a criatividade na
contabilização de receitas e despesas quase sempre leva a alguma fraude ou “pedalada” fiscal.
O criacionismo contábil tem por premissa
a esquiva do principal objetivo da contabilidade, que é o de fielmente
registrar a situação patrimonial e fiscal da entidade. Assim, à luz da ética e
da moral, a contabilidade criativa caminha na escuridão, pois, é cega diante
princípios elementares da ciência contábil.
A maquiagem de contas contribuiu
decisivamente na consolidação do atual quadro de penúria financeira vivenciada
pelos estados. A real gravidade do desiquilíbrio entre receita e despesa foi solapada
durante anos, graças à boa tolerância que os órgãos de fiscalização e controle têm
com a metodologia contábil personalizada utilizada por uma boa parte dos entes
públicos, justamente os que, hoje, encontram-se em colapso.
A Secretaria do Tesouro Nacional (STN)
há muito vem acusando a prática da contabilidade criativa e a leniência dos
órgãos de controle em relação a essa. Um dos apontamentos do STN revela que no
ano de 2017 a maioria dos estados se enquadraram artificialmente em limites
prudenciais da lei de responsabilidade fiscal, através da contabilização de
percentuais menores de comprometimento da receita corrente líquida (RCL) com a
respectiva folha de pagamento.
Goiás, por exemplo, é citado com um furo
em torno de 20% em relação ao que declarou. Não obstante a conclusão do STN de
que tal diferença foi dissimulada pela contabilidade criativa, o pecado
contábil não sofreu penitência ou sermão por parte do pleno do TCE.
Apenas para ilustrar, no final de 2017 a
França editou norma que obriga as agências de publicidade destacarem em suas
propagandas o termo: “imagem retocada”,
no caso da real aparência dos modelos fotográficos for alterada por softwares de edição de imagens. A
iniciativa busca minimizar os males que a “ditadura
da beleza” provoca no público feminino, perigosamente influenciado pelos
perfeitos, porém irreais, corpos e rostos.
Traçando um paralelo com o exemplo
europeu, sendo tolerado enfeitar o real resultado da situação patrimonial,
fiscal e econômica da entidade, a sinceridade imposta à propaganda francesa é o
bom exemplo a ser seguido pela contabilidade brasileira.
Imaginem só os registros contábeis
patrimoniais e financeiros trazendo logo na sua abertura, o seguinte aviso: “Cuidado, contabilidade criativa”.
Dez/2018
Cláudio Modesto