Por
se tratar de prestação de serviço público do qual o cidadão não pode se furtar
caso pretenda possuir ou conduzir um veículo, torna-se simples a estratégia
utilizada para arrancar dinheiro do usuário: criam-se factoides para faturar com
eles.
Assim
ocorreu com o “kit” primeiros socorros, cursos obrigatórios, extintor ABC,
mudança de padrão de placas, tarjetas, lacres, exames, simuladores, vistorias,
e tudo mais que a imaginação possa conceber.
Como
todo bom factoide, as descabidas exigências servem para dissimular o verdadeiro
motivo de sua implementação: ganhos financeiros indevidos em benefício de
seleto grupo credenciado para executar os serviços ou vender os produtos
exigidos pelo órgão.
Pois
bem, concebido em 2017 e definitivamente implementado em 2019, o mais novo
factoide do DETRAN de Goiás é a cobrança administrativa de sua Dívida Ativa. O
discurso de eficiência na recuperação de ativos serviu apenas para disfarçar a
real intenção de inserir a cobrança ilegítima de honorários advocatícios.
Em
julho de 2017 foi publicada a lei n. 19.772, que alterou a Lei n. 17.790/12,
fixando e autorizando a cobrança de honorários advocatícios não arbitrados judicialmente no
percentual de 10% sobre o valor do débito em cobrança administrativa, cujo
produto da arrecadação deve ser repartido entre os advogados lotados no DETRAN.
O
fato é que advogados públicos, segundo o Código de Processo Civil, só podem receber honorários da espécie sucumbencial,
ou seja, aquele percentual fixado a critério do juiz da causa e devido pela parte perdedora ao advogado da parte ganhadora somente após o trânsito em julgado da ação. Impossível, então, conceber honorários de sucumbência "não arbitrados judicialmente".
Obrigar
o cidadão contribuinte ao pagamento de honorários advocatícios sem que exista ao menos o ajuizamento de ação correspondente, não se trata apenas de um ato imoral, é odioso, e a existência
de eventual legislação prevendo a tunga não é capaz de aplacar essa indecência.
A propósito, o “kit” primeiros socorros, extintor ABC, simuladores, exames,
vistorias, etc.; todas essas indecências foram precedidas de legislação
específica.
O
curioso é que o próprio presidente do DETRAN-GO, Marcos Roberto Silva, é
contrário à cobrança dos honorários advocatícios na dívida ativa do órgão. Sua posição ficou clara na última quinta-feira (5) em reunião com a procuradoria da
casa, ocasião em que o dirigente do órgão solicitou, em vão, a exclusão dos
honorários advocatícios durante a semana de conciliação do IPVA e ITCD que será
realizada pelo governo estadual entre os dias 4 e 8 de novembro próximo.
O
presidente do DETRAN apenas enxergou o óbvio: aumentar a dívida do cidadão não
contribui em nada para o cumprimento voluntário da obrigação, muito pelo
contrário.
Na
ocasião foi informado a Marcos Roberto que a Economia, antiga SEFAZ, faz esse
tipo de cobrança administrativa sem acrescer qualquer ônus extra ao cidadão
contribuinte. Difícil entender, então, o porquê da imoralidade ainda persistir.
O
Ministério Público move Ação Civil Pública contra Carlinhos Cachoeira por
supostamente ter recebido indevidamente do DETRAN de Goiás R$ 916 mil entre os
anos de 2010 e 2012. Narra a denúncia que o
modus operandi do grupo se dava através do aparelhamento e direcionamento do órgão
com o fim de se obter vantagens financeiras indevidas.
Coincidências à parte, receber
10% sobre a inadimplência de usuários do DETRAN através de subterfúgio imoral,
em cálculo de padeiro, demonstra que Cachoeira custava bem menos ao cidadão.