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quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

PEDÁGIO E A OBRIGATORIEDADE DE EMISSÃO DE DOCUMENTO FISCAL


Custa acreditar que a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias – ABCR e a Concessionária Triunfo Concebra, fossem capazes de prestarem tamanho desserviço à sociedade com o espetáculo de desinformação que apresentaram por meio das notas de esclarecimentos divulgadas em suas respectivas páginas de internet[1].

No afã de justificar a falta de emissão de documento fiscal pelas praças de pedágio que se espalham pelo Brasil, proferiram teratologias tributárias que não podem passar desapercebidas, dentre as quais destaco e comento:

1º Destaque:

  • “[...] nota fiscal é para venda de mercadorias em geral e serviços de comunicação, transporte intermunicipal e fornecimento de energia, atividades de pagamento do ICMS (imposto Estadual), o que não é caso do pedágio, categoria de prestação de serviço que paga ISS [...]”

Comentário:

A emissão de nota ou cupom fiscal, que são espécies do gênero documento fiscal, trata-se de obrigação tributária acessória imposta a qualquer pessoa física ou jurídica que produza ou circule bens e/ou serviços, cuja obrigatoriedade legal de emissão está prevista na legislação tributária do sujeito ativo do tributo, que no caso do fato gerador concernente ao chamado “pedágio”, é o município[2].

2º Destaque:

  • “[...] A lei (instrução normativa 1099 de 15 de dezembro de 2010) determina que seja entregue ao usuário um recibo [...] O recibo entregue no pagamento da tarifa nas praças administradas pela Triunfo Concebra atende à lei [...]”

Comentário:

Sobre fatos geradores do ISSQN - caso clássico dos serviços públicos concedidos à iniciativa privada e remunerado por tarifa (pedágio) - somente ao município da ocorrência da prestação dos serviços é reservado o direito de legislar sobre a obrigação acessória de emitir nota fiscal, tratando-se, pois, de iniciativa privativa do ente municipal, não podendo a Receita Federal interferir nessa competência constitucional[3], ainda mais por mero ato administrativo.  

Ao citar a I.N. n. 1099/10-RFB, a Concessionária comete dois erros: o primeiro por nominá-la como sendo uma lei; pois, como já referido, não passa de mero ato administrativo e que só teria aplicação de forma subsidiaria, caso a lei municipal não contemplasse o rol das discriminações mínimas que esse atribui ao documento fiscal. O segundo é o de usá-la como excludente da obrigação acessória imposta por lei municipal – a única apta a tal – de emitir o documento fiscal referente a fatos geradores do ISSQN.

3º Destaque:

  • “[...] pedágio é tarifa, o recolhimento do imposto é ISS pois se trata de prestação de serviço, essa tarifa não é deduzida no Imposto de Renda. [...]”
  • “[...] as concessionárias devem emitir recibos do pagamento, que servem para todos os fins necessários de comprovação de pagamento [...].

Comentário:

Toda pessoa física que se utiliza do livro-caixa para apurar o IRPF, ou pessoa jurídica que se submete ao regime de apuração do IRPJ pelo lucro real pode deduzir a despesa “pedágio” da base de cálculo do Imposto de Renda.

Exemplificando: uma sociedade de advogados, um representante comercial, um autônomo ou um empreendedor; que para desenvolver sua atividade profissional tenha que fazer uso de pedágio no valor de R$ 4,30; vai ter uma despesa diária de R$ 8,60 - anualmente calculada em cerca de R$ 3.000,00. Nesse exemplo, escriturando essa despesa no livro-caixa do IRPF ou na apuração do IRPJ (lucro real) gerariam uma economia de até R$ 825,00 de I.R ao ano.  É pouco pra você?

Destarte, ao contrário do que afirmam, a despesa de pedágio pode sim ser deduzida do I.R. A propósito da afirmação de que os recibos que fornecem servem para todos os fins necessários, também temos que discordar, em especial porque além de não se tratar de documento fiscal próprio, esses recibos são totalmente apócrifos quanto ao tomador do serviço; assim sendo, a rigor, são imprestáveis como prova de despesas pessoais, inclusive para fins de dedução do I.R.

Conclusão:

Não é necessário muito esforço para perceber a importância do direito do cidadão receber e do dever do prestador ou fornecedor emitir documento fiscal idôneo relativo a operações de compra/venda de mercadorias e serviços; já que tal ato se apresenta como verdadeira matriz de todas as demais obrigações tributárias principais e acessórias atinentes à produção e circulação de bens e serviços.

Conclui-se que a resistência das Concessionárias de rodovias em emitir o regular documento fiscal em suas praças de pedágio é no mínimo estranha, especialmente quando se trata de atividade que envolve um movimento anual de bilhões de reais, circulados em moeda corrente, cédulas usadas e em sua maioria de pequeno valor. Não é necessária muita malícia para perceber que tais circunstância criam o ambiente ideal para inúmeras práticas ilícitas.

 Daí a importância da emissão do documento fiscal legalmente exigido na respectiva operação de compra e venda de mercadorias e serviços, prática que transcende o mero controle fiscal-tributário, consistindo-se no meio mais eficaz de prevenção a ilícitos mais graves, tais como a lavagem de dinheiro, a evasão de divisas, o caixa-dois, o contrabando/descaminho; dentre outros tantos que o Brasil já está cansado vivenciar.



[1] Notas de esclarecimento disponíveis em:  https://drive.google.com/file/d/0B1ami__vgnZOVnBDQjJ5dGw0WTQ/view?usp=sharing 
Acessado em 29/12/2015

e em: http://www.abcr.org.br/Conteudo/Noticia/8712/abcr+alerta+sobre+video+na+internet+que+incentiva+pratica+ilegal+de+evasao.aspx  Acessado em 29/12/2015
[2] § 3º do Art. 1º da Lei Complementar n. 116/2003
[3] Art. 156, III da CF/88

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

NOTA FISCAL - Dever cívico


TEXTO ORIGINAL CLIQUE AQUI

Todos querem viver às custas do Estado, mas esquecem que o Estado vive às custas de todos. – (Frédéric Bastiat, economista Frances, 1801 a 1850)

Segundo o organismo internacional Tax Justice Network, sediado em Londres, cerca de 280 bilhões de dólares são sonegados no Brasil a cada ano. Na cotação atual isso significa que quase um trilhão de reais deixa de ser revertido em benefícios para sociedade anualmente.

Se considerado a sua participação no PIB brasileiro o Estado de Goiás contribui para essa evasão em aproximadamente 25 bilhões de reais. Em resumo, pela perspectiva mais otimista, para cada real arrecadado, dois são sonegados.

Isso também significa que uma parcela maior da carga tributária é colocada sobre os ombros daqueles contribuintes que cumprem pontualmente suas obrigações. É justamente por isso que o fisco pode e deve trabalhar no sentido de promover o equilíbrio e a justiça fiscal, cujo caminho passa necessariamente ao frontal combate à sonegação.

Nessa senda, a emissão e o fornecimento de nota fiscal em operações de compra e venda é a mais elementar obrigação fiscal a ser cumprida por atividades empresariais que comercializam mercadorias e serviços; e, em face tal obrigação, o fisco deve ser intransigente aos que se excluem desse dever legal e cívico, inclusive com a repercussão penal imediata diante da omissão (Art. V da Lei 8.137/90), já que a conduta é formal e se encontra excluída do rol taxativo da Sumula Vinculante nº 24 do STF.

O objetivo não é o de somente sensibilizar o contribuinte para as consequências negativas da sonegação, mas também é o de promover mudanças culturais, de modo que o não cumprimento de obrigações fiscais não seja mais tolerado por nossa sociedade.

Não podemos deixar de ressaltar que o cidadão é o mais eficiente e promissor fiscal que um país pode ter. Por isso é de se conclamar a toda sociedade que ajude o Estado na luta contra a sonegação fiscal, seja exigindo o documento fiscal relativo às compras que realizar, seja denunciando nos canais competentes os que deixarem ou recusarem fornecê-lo.

Esse apelo também é dirigido aos empreendedores e administradores de atividades empresárias no sentido de cumprirem a singela obrigação de emitir e fornecer documento fiscal de venda, apresentando ao agente fiscal sempre que solicitado os comprovantes de emissão, pois só ao sonegador é quem cabe temer a presença do fisco, não tendo razões de temor o contribuinte que trabalha regularmente.

Trabalhando em conjunto: fisco, cidadão e contribuinte; teremos papel ativo no combate a sonegação fiscal, viabilizando o estado brasileiro na promoção do bem-estar coletivo e no oferecimento de serviços públicos acessíveis e de qualidade, estimulando assim cada vez mais nossos contribuintes a cumprirem voluntariamente as suas obrigações fiscais.

ADVOGADO-JUIZ



Conselheiro Advogado, vício insanável no contencioso administrativo tributário.

Em maio de 2015 o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil decidiu que seus membros regularmente inscritos estavam proibidos de advogar caso desempenhem funções de julgadores no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda – CARF. 

A decisão foi arrimada na tardia conclusão que o exercício da advocacia, nos termos do Estatuto da OAB, é incompatível com a função de julgador em tribunal administrativo tributário.

A atividade conjugada de Advogado-Juiz foi permitida por décadas pela OAB no âmbito do CARF, sendo tal permissividade justificada principalmente pelo fato de não ser remunerada a função de Conselheiro classista naquele órgão administrativo, que tem por atribuição julgar impugnações de lançamentos tributários efetuados pela Receita Federal. Era, até então, imprescindível que o advogado buscasse o próprio sustento no exercício da respectiva profissão, caso se dedicasse à gratuita missão de julgar lançamentos tributários federais.

A mudança de posição da OAB ocorreu concatenada com a recente aprovação pelo governo federal de gratificação (jeton) a ser paga aos Conselheiros classistas do CARF conforme a frequência desses em sessões de julgamento, cuja retribuição pecuniária pode ultrapassar os 10 mil reais por mês. Assim, foi pacificado pela própria OAB o entendimento de que é vedado o exercício da advocacia por membros de tribunais administrativos, já que remunerados para tal função.

Já a versão goiana do CARF é consolidada pela existência do Conselho Administrativo Tributário – CAT, vinculado à Secretaria da Fazenda do Estado de Goiás. Já faz muito tempo, 20 anos ou mais, que os membros do CAT são remunerados através de jetons, que podem chegar a cerca de 6 mil reais por 22 participações em sessões que ocorrem em dias úteis na parte da manhã, ou seja, meio período.

Com a consolidação, pela própria OAB, do entendimento que existe impedimento ao advogado que julga processos tributários na seara administrativa, vem-me séria preocupação com o contencioso tributário goiano; já que, atualmente, quase a metade dos Conselheiros classistas que atuam no CAT, cerca de 7, são advogados regularmente inscritos na Ordem, seção Goiás, cujos julgamentos lavrados pelos mesmos, em tese, são nulos de pleno direito pela mácula do impedimento.

Exemplo disso é que desde o ano de 2013, magistrados membros do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP começaram a produzir decisões judiciais que anulavam certidões de dívida ativa; e, por consequência, extinguiam as respectivas execuções fiscais, em razão dessas serem constituídas por lançamentos tributários onde se constatou a participação do Advogado-Juiz no contencioso administrativo que tramitou no Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo – TIT, versão paulista do CARF.

Aqui em Goiás já se discute abertamente no meio acadêmico e jurídico a possibilidade de anular execuções fiscais pelo vício de ordem pública do impedimento do Conselheiro que decidiu pela legalidade do crédito tributário lançado e inscrito em Dívida Ativa, e pior: ventila-se ainda a possibilidade de se ingressar com ações judiciais requerendo a restituição do imposto já pago nessas circunstâncias. Seria um desastre.

Não obstante a gravidade do quadro atual, especula-se que a Administração Tributária estuda a possibilidade de reservar uma cadeira do CAT à classe dos advogados públicos. Ou seja, ao reverso de impedir a visível contaminação que eiva de nulidade os créditos tributários julgados pelo CAT, extinguindo a causa, o que se pretende é aumentar a nódoa.

É esperar pra ver.

CLAUDIO MODESTO


IPVA – Cobrança abusiva



Apesar de ser Auditor Fiscal há 18 anos me espanta a sanha arrecadatória que a Administração Fazendária do Estado de Goiás vem dispensando ao cidadão comum. 

No caso específico do IPVA majorou alíquotas, aumentou a idade do veículo para isentá-lo, diminuiu pela metade o prazo para quitação desse tributo e recentemente vinculou o CPF de pessoas com pendências financeiras, impedindo-as de realizar qualquer serviço junto ao DETRAN independentemente de qual veículo paira a pendência.

Não bastasse isso, sistematicamente vem empregando forma ilegal e abusiva para constranger o contribuinte a quitar o IPVA atrasado, através da realização de blitze diárias em todo o Estado de Goiás, onde policiais militares abordam o veículo e obrigam o motorista a se dirigir a uma agência bancária para recolher imediatamente o tributo.

Ilegal é o método de cobrança porque a investida dos agentes é acompanhada da ameaça de apreensão do veículo em razão do pretenso atraso do seguro obrigatório e
anual, mas de modo ardiloso vincula o pagamento desses emolumentos à quitação do IPVA, que por si só não dá causa legal à apreensão do veículo.

A vinculação de pagamentos diversos é circunstância vedada pelo ordenamento tributário, o que torna a prática dessa forma de cobrança  abusiva e arbitrária. Sendo a parte mais frágil dessa relação jurídico-tributária, o pobre do contribuinte acaba sendo obrigado a ficar de joelhos ante a covarde condicionante, pois inviável economicamente questionar a ilegalidade. 

Consentâneo destacar que o referido tratamento fiscal que vem sendo dispensado ao cidadão comum é bem diferente do que é reservado a certos grupos econômicos, que são reiteradamente agraciados com benefícios e perdões fiscais de cifras bilionárias, concedidos sem nenhum constrangimento pela pasta fazendária.

A esperança que resta ao cidadão espoliado é o Ministério Público ou a OAB, que podem acabar com essa farra em dois tempos. A propósito: por que não fizeram nada até agora? 

CLAUDIO MODESTO
Auditor Fiscal da Receita Estadual
Bacharel em Direito
Especialista em Direito Tributário