Os royalties remuneram
o direito de usar uma propriedade intelectual, patente ou marca.
Em 2018 a Lei
Estadual n. 20.233 introduziu no “mercado” de cobrança de créditos públicos um
novo produto: os encargos legais, com o patrocínio da Procuradoria Geral do Estado - PGE.
A propaganda é sedutora: melhorar a cobrança administrativa da dívida ativa não-tributária e de sobra adicionar uma comissão de 10% a título de encargos legais, cujo produto da arrecadação será objeto de rateio entre os servidores envolvidos na cobrança e o órgão credor, além da PGE, claro.
Procon e Meio Ambiente são, por enquanto, os primeiros órgãos que acrescentaram os encargos legais na cobrança dos
créditos formados pelas multas que aplicam, porém na semana passada a PGE deu
um grande passo para expandir o seu produto.
Na terça-feira
(2) a Assembleia Legislativa aprovou alteração na Lei n. 20.233/18, autorizando
a PGE firmar convênios e termos de cooperação para cobrar créditos devidos a outros
órgãos e poderes, acrescendo nas respectivas dívidas os encargos legais.
O curioso é que pasta fazendária - que sempre fez a cobrança de tais créditos - não foi consultada na elaboração do projeto, isso mesmo após a aprovação pelos deputados de requerimento nesse sentido em dezembro do ano passado.
Na primeira votação
do PL que alterou a lei dos encargos legais, dia 19 de maio, o deputado líder
do governo, Bruno Peixoto, encaminhou voto favorável à matéria informando que a diligência na Economia retornou sem
manifestação. A secretária Cristiane Schmidt desmentiu o deputado logo após a votação, obrigando o parlamentar pedir desculpas
publicamente pelo “equivoco”.
Afinal, qual era o temor de ouvir a opinião da pasta fazendária em processo legislativo que trata de cobrança administrativa de créditos públicos, cuja expertise do fisco nessa matéria vem de décadas?
Talvez a principal razão seja porque o serviço público de cobrar créditos tributários e não-tributários é normalmente realizado pela pasta da Economia sem qualquer custo adicional para o contribuinte. Sendo mais claro: sem cobrança de royalties pela expertise na prestação do serviço, fato que poderia embaraçar a votação do projeto.
Todavia, desconfia-se
que o temor da opinião da pasta fazendária na iniciativa de se acrescentar
encargos legais na cobrança administrativa de créditos públicos vai além do
inexorável fato de que tal serviço é oferecido pelo fisco de forma eletrônica e na modalidade "pro bono" a qualquer órgão ou poder que manifestar interesse.
Realmente, existem outras incongruências nos encargos legais.
Senão, vejamos algumas delas:
- TRATAMENTO ANTI-ISONÔMICO:
Duas
formas distintas e simultâneas de cobrança pela mesma fazenda estadual, uma
realizada pela pasta da Economia, sem encargos legais; e outra pela PGE que cobra do cidadão 10% a mais do que é normalmente devido.
Trata-se
do mesmo serviço público (cobrança) com gravames distintos para cidadãos que se
encontram na mesma situação, e que não podem optar pelo serviço menos oneroso.
A
incidência de multas e juros moratórios pela inadimplência já é a justa punição
do devedor pelo atraso, acréscimos que servem justamente para compensar a fazenda pública no gasto com a respectiva
cobrança.
Admitir acrescentar à dívida mais 10% pelo simples fato de a fazenda pública emitir o próprio título de crédito é institucionalizar o bis in idem.
Tal
circunstância é ainda agravada no caso de execução fiscal, pois ao valor da
dívida já acrescida de 10% a título de encargos legais, será majorada em outros
10%, agora a título de honorários de sucumbência (judicial).
- INEFICIÊNCIA: UMA FAZENDA PÚBLICA, 3 (TRÊS) DÍVIDAS ATIVAS:
Goiás
possui atualmente três (3) dívidas ativas: Economia, Detran e agora a da PGE
(SEMAD e Procon), criada especialmente para viabilizar a cobrança dos encargos legais.
Essa
pluralidade de órgãos no controle dos créditos públicos interfere na eficiência
do serviço. Exemplo disso é que atualmente milhares de pessoas físicas e
jurídicas possuem apontamento na D.A. do Detran e da PGE, todavia sem nenhuma
restrição na D.A. da pasta da Economia, possibilitando que essas pessoas emitam
certidão negativa no órgão fazendário para todos os fins legais (cargo público,
licitações, inventários, etc.), mesmo
sendo devedoras do Estado nos sistemas do Detran e/ou da PGE.
Criar
obrigação legal de remunerar regularmente servidores a qualquer título que seja,
significa instituir despesa de caráter continuado, que no caso da
Lei 20.233/2018 foi efetivada sem estudo de impacto ou demonstração de prévia
dotação orçamentária, ofendendo a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF.
- REMUNERAÇÃO INCONSTITUCIONAL:
Por
tratar de tema diverso (cobrança administrativa), a Lei 20.233/18 ao instituir
espécie remuneratória a servidores públicos, não atendeu ao critério
constitucional da “lei específica” para criação dessa vantagem (artigo 37-X da
CF/88).
Pior
ainda, com a recente alteração legislativa, os critérios de repartição do produto da
arrecadação poderão ser definidos por meio de convênios e termos de cooperação
firmados entre PGE, órgãos e poderes que aderirem a essa modalidade de
cobrança mais onerosa ao cidadão.
Essas são algumas das incongruências que deixaram de ser informadas pela pasta da Economia aos deputados antes da votação do projeto, por conta da diligência que os próprios requisitaram, mas que não ocorreu.
Chamou a atenção o “equivoco” do líder do governo em informar aos seus colegas deputados que a diligência foi realizada, mas retornou “sem manifestação” do fisco, insistindo nessa narrativa mesmo após ser desmentido e repreendido pela titular da Economia.
Se ao final de tudo for considerado legal, moral, legítimo e razoável cobrar encargos legais do cidadão apenas para que a fazenda pública constitua o próprio título de crédito, vale deixar registrado duas dicas para os órgãos e poderes autônomos que optarem pelos encargos legais:
1. É totalmente dispensável a participação da PGE na cobrança administrativa de
créditos públicos;
2. Enviar título para protesto em cartório qualquer servidor faz.
Prestem atenção nessas dicas, ou vão dividir royalties à toa.
Afirmamos isso com a autoridade de servidores que têm quase um século de expertise na cobrança administrativa de créditos públicos.
Quanto mais leio seus artigos, Cláudio, mais tenho a certeza de que sua capacidade está sendo subutilizada pela Pasta Fazendária. Uma pena para o estado de Goiás.
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