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  • Por que protegemos um sistema que nos fere?

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quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Futura Lei Orgânica do Fisco é debatida por entidades nacionais

Durante os dias 21 e 22, Francelino Valença, presidente da Fenafisco, juntamente com os diretores Celso Malhani, Glauco Honório e Cláudio Modesto, que também é diretor do SINDIFSICO-GO,  acolheram representantes de diversas entidades nacionais participantes do Pacto de Brasília e a advogada e consultora jurídica, Drª Adriana Schier, na sede da Fenafisco. O encontro teve como objetivo principal a discussão sobre a criação do anteprojeto de Lei Orgânica da Administração Tributária (LOAT).

O evento iniciou com uma sessão de oitivas, onde os participantes compartilharam insights cruciais e estabeleceram as bases técnicas fundamentais para guiar o desenvolvimento da LOAT. O foco era reforçar a Administração Tributária no contexto da reforma tributária em andamento.

Dentre os aspectos abordados, destacaram-se temas como tributação, arrecadação, fiscalização, cobrança, contencioso administrativo e gestão de riscos, com ênfase na importância do papel do Estado e nas carreiras exclusivas.

Foram também discutidas questões específicas relacionadas à estrutura da Administração Tributária, abrangendo suas competências, prerrogativas, garantias, direitos e deveres associados aos cargos da instituição.

Em sua exposição, a Drª Schier enfatizou a importância vital da Administração Tributária para a cidadania e para o Estado Democrático de Direito, defendendo sua institucionalização. Ela ressaltou que a LOAT transcende interesses corporativos, sendo fundamental para a implementação de políticas públicas eficazes em áreas como saúde, educação e justiça. Schier destacou a necessidade de centralizar a Administração Tributária no debate sobre a formulação e controle de políticas públicas.

Nos próximos encontros, que ocorrerão nas semanas seguintes, o grupo continuará a trabalhar no projeto, visando apresentá-lo à autoridade competente para iniciar seu processo legislativo, além de elaborar uma justificativa para apoiar a aprovação do projeto.

O Pacto de Brasília é composto por diversas entidades, incluindo a Fenafisco, Anfip, Anafisco, Febrafisco, Fenafim, Sindifisco Nacional, Sindireceita e Unafisco Nacional.

terça-feira, 12 de setembro de 2023

Corregedoria não resolve crise de liderança e gestão

Chamou a atenção o e-mail oriundo do gabinete da Corregedoria Fiscal da Secretaria da Economia (COF), enviado ao grupo “fisco” na última quarta-feira (6), noticiando, em suma, que aquele órgão correcional passará a monitorar o desempenho das tarefas executadas pelos auditores-fiscais, bem como notificará para explicações os servidores fiscais que não atingirem a pontuação mínima exigida.

Adverte o chefe da COF, que o auditor apontado como insuficiente pelo sistema de gestão fiscal (SGF) será notificado pela correição da pasta fazendária para apresentar explicações, que posteriormente serão “avaliadas” pelo chefe imediato. Alerta ainda, que em um segundo momento, a Corregedoria passará a verificar “aleatoriamente” as atividades desempenhadas pelos Auditores-Fiscais e suas respectivas inserções no SGF.

Pois bem. A avaliação de desempenho é uma importante ferramenta administrativa que tem como objetivo medir e melhorar a performance dos servidores em suas respectivas tarefas. Quando utilizada adequadamente, ajuda a identificar gargalos, a correção de falhas, além de possibilitar o reconhecimento de méritos coletivos e individuais, além de ser um indispensável auxílio para tomada de decisões.

Todavia, trata-se de erro crasso a interposição corriqueira do órgão correcional na missão de avaliar o desempenho de servidores ou monitorar as tarefas que executam. Afinal, a gestão de pessoas é justamente a razão de existir da chefia imediata, que no caso do fisco são majoritariamente os supervisores, delegados e gerentes.

A chefia imediata possui papel crucial na gestão, supervisão e liderança da equipe sob sua responsabilidade. Em regra, o chefe imediato possui conhecimento aprofundado e específico sobre as tarefas, projetos e contextos nos quais sua equipe está inserida. Isso o posiciona de maneira única para avaliar produtividade e desempenho do grupo de maneira qualificada e contextualizada, pois a sua proximidade, além de permitir a rápida identificação de problemas, proporcionam melhor feedback e orientação aos membros da equipe.

Assim, nenhum sentido faz a COF notificar o auditor para dar explicações sobre produtividade para só depois chamar o respectivo chefe para avaliar a justificativa apresentada. Ora, onde estava a chefia imediata que não identificou e corrigiu a incongruência antes que ela virasse um problema correcional? Isso também não é trabalhar mal?

A correição ordinária pode e deve ocorrer sobre setores ou unidades administrativas como um todo, e caso sejam identificadas incongruências  é a chefia desse setor ou unidade quem deve dar explicações ao órgão correcional. Afinal, a gestão, liderança e responsabilidade é dele.

A mensagem implícita que o e-mail da COF trouxe à tona é que nossos chefes não conseguem ou não querem resolver o problema. Isso vem ocorrendo há algum tempo com os procedimentos disciplinares que versam sobre o atraso e retenção de processos SEI´s e PAT’s, onde aproveito para questionar mais uma vez: onde estava a chefia imediata que não identificou, reclamou e solucionou o problema desses atrasos?

O fato é que, provavelmente, os respectivos chefes sequer sabem que seus subordinados retinham  processos, mesmo sendo obrigação do gestor saber melhor que a COF o que acontece em sua unidade. E, principalmente: agir antes do órgão correcional.

Fora disso, qualquer sanção ao servidor deve ser estendida ao seu chefe imediato, a não ser que “trabalhar mal” seja uma sanção administrativa de mão única. A propósito, alguém conhece algum chefe que foi punido nessas circunstâncias? Eu não conheço.

E por que a atuação da COF nesses casos só vai conseguir piorar o problema? Porque a ausência de gestão e liderança não se resolve com corregedoria, resolve-se com generosas doses de gestão e liderança.

A Corregedoria só deveria agir nessas situações em último caso, quando acionada pela chefia imediata do servidor, após esgotadas todas as possibilidades e meios ordinários de resolução do conflito.

Em qualquer organização governamental minimamente ética, eficaz e especialmente produtiva, o procedimento disciplinar é invocado em “ultima ratio”. Na Economia a lógica é inversa, pois sua invocação é “prima ratio”, especialmente quando se trata do fisco.

Para exemplificar a obsessão pelos auditores-fiscais, o e-mail da “produtividade” foi endereçado especificamente para os servidores do fisco, ignorando que a pasta fazendária possui outras dezenas de carreiras, com milhares de servidores, que também devem ser “produtivos”, e sujeitos à fiscalização “aleatória” da COF.

A exclusão dos servidores não-auditores da mira da COF,  talvez se deva ao fato de não terem maiores problemas com suas lideranças e gestores.

Nesse cenário, não há como disfarçar o flerte da Administração Tributária com o odioso assédio moral, no desiderato de solucionar a grave crise de gestão e liderança que atravessa.

O que está ruim, tende a piorar muito. Oremos!

 

Claudio Modesto,

Diretor Jurídico e de Defesa Profissional da Fenafisco e do Sindifisco-GO




 

segunda-feira, 12 de junho de 2023

Herói de araque!


O termo "herói de araque" é uma expressão popular usada para descrever alguém que se apresenta como um herói, mas que na realidade não possui as qualidades ou habilidades necessárias para ser considerado como tal.

 Essa expressão é comumente usada para se referir a pessoas que fingem ser heróis ou aos que simplesmente caem no devaneio de se considerar um, buscando satisfazer o próprio ego ou numa dissimulação para dar vazão a pretensões nada heróicas.

Na semana passada (7) a Procuradora-Geral do Estado, em nota à coluna Giro de ‘O Popular’, agiu como a chefe da ‘liga da justiça’, ao declarar, em suma, que o projeto de lei que autoriza a entrada da PGE no CAT, é crucial para garantir a imparcialidade e assegurar a defesa da legalidade.

A declaração da chefe da PGE mais parece com discurso de herói da Marvel antes de enfrentar a batalha final, verberando sobre justiça e  proteção aos fracos e oprimidos.

Não se engane, trata-se de discurso de herói de araque, dissimulado ou delirante. Explico:

Não obstante a PGE participar do contencioso tributário administrativo na maioria dos estados, o modelo defendido pela PGE goiana diverge significativamente dos modelos adotados em outras unidades federativas, onde os procuradores funcionam no contencioso tributário normalmente por meio da ocupação de uma cadeira de julgador, ou de representação fazendária ou ainda como consultor ou assessor jurídico.

A PGE esconde da sociedade goiana que o modelo proposto no projeto de lei n. 914/2023 não é o que predomina em outros estados, mas sim um perigoso novo modelo, com a concessão de novas atribuições e prerrogativas aos procuradores do Estado de Goiás, sem paralelo em outras unidades da federação.

O modelo goiano perseguido pela PGE, na prática, transfora o procurador do Estado em uma espécie de custos legis, ou fiscal da lei, numa aventura legislativa que adiciona poderes megalomaníacos ao papel do procurador, com potencial real de provocar a inevitável quebra da paridade entre contribuintes e o fisco, cujo equilíbrio é um dos pilares do contencioso administrativo tributário.

Em termos práticos, a proposta enviada à Assembleia Legislativa, confere ao procurador do estado uma posição privilegiada no processo ao inseri-lo como espécie de litisconsorte ativo necessário, cuja figura processual é própria daqueles que possuem interesse direto relacionado ao resultado da demanda.

Embora o projeto de lei goiano não conceda ao procurador do estado o direito a voto, isso não impede que ele possa interferir decisivamente no seu resultado. A figura do procurador, conforme proposto, transforma-o numa espécie de peça-chave na sistemática processual, com forte influência nos rumos da decisão, sem precisar se submeter ao escrutínio do voto.

Ao contrário do altruísmo dos heróis de verdade, a proposta de lei em questão também escancara uma característica egocentrista e elitista, típica de vilões, pois o modelo também desenha um processo administrativo tributário onde a PGE terá tratamento privilegiado e de ascendência entre os demais membros que atuam no Conselho.

O projeto prevê claramente tratamento anti-isonômico entre os atores do processo,  uma vez que faculta ao procurador do estado a se envolver apenas em demandas de alto valor e ainda assim nos casos considerados pela PGE como relevantes, tudo isso em aberto desprestígio aos demais participantes do CAT, que continuam sem poder escolher livremente quando e em qual processo atuar.

Dessa maneira, a PGE funcionaria como um herói de elite, que não se sujeitaria ao combate de “crimes” tributários corriqueiros, que correspondem aproximadamente a 99% dos processos que tramitam no CAT. Seriam acionados apenas naqueles casos com risco de abalar - na própria visão do herói - a legalidade e imparcialidade na atuação do CAT, que curiosamente, segundo o modelo proposto, ocorrerá somente em processos milionários.

Assim sendo, os pequenos e médios contribuintes, que além de maioria no CAT, normalmente são os hipossuficientes e mais expostos a injustiças, continuariam sujeitos ao atual contencioso tributário ilegal e parcial que a procuradora-geral se refere em sua nota, onde solenemente omite que os contribuintes "mais fracos" não serão alcançados pela gloriosa atuação da PGE.  Coisa de Vilão.

Agora, raciocinemos: por que a PGE goiana não propôs o modelo usual de atuação dos procuradores do estado no contencioso tributário, que como afirma, vigora nos outros 25 estados da federação?

Respondo: porque no modelo convencional os procuradores teriam que carregar o piano juntamente com os outros membros do CAT, situação inconciliável para uma carreira (típica de estado?) que não tem dedicação exclusiva, advoga na iniciativa privada, é autorizada a empreender, e ainda, ordinariamente, não está obrigada a cumprir mais que 20 horas semanais de expediente.

Nas leis de carreiras do fisco, da polícia, de professores e demais servidores estaduais de Goiás está estampado claramente o dispositivo legal que define a carga horária que se submete a respectiva categoria, normalmente de 40 horas semanais. Ganha um doce quem encontrar em qual lei ou regulamento está estampada a carga horária que se submete os procuradores do estado.   

Por tudo isso, sem delírios, o projeto de lei que abre as portas do CAT para a PGE está mais para um plano de vilania típico de estórias infanto-juvenis. Apenas um pretexto para alcançar um objetivo maior: dominar o mundo!

quinta-feira, 25 de maio de 2023

Um dia de caos


No calendário brasileiro, o dia 25 de maio tem sido marcado por algumas instituições privadas como "um dia sem impostos". Parece algo tentador, não é mesmo? Comerciantes vendendo produtos e serviços sem incluir o famigerado imposto. Seria como um sonho realizado para muitos contribuintes e consumidores, mas será que realmente compreendemos as reais  consequências dessa iniciativa?

 Fosse realmente possível promover um dia sem impostos, por coerência também seria um dia sem UTI’s, sem escola, sem policiais e em boa parte do território nacional sem poder fazer uso da eletricidade, água potável, estradas, pontes, transporte etc.

 Então, vamos tentar conceber esse dia como ele realmente deve ser concebido, analisando o que está em jogo, afinal o imposto excluído é o mesmo que financia o bem-estar social garantido pelo Estado por meio de serviços públicos essenciais. 

Senão, vejamos:

 Começando pelo sistema educacional. Atualmente, existem no Brasil cerca de 41,5 milhões de jovens matriculados no ensino básico público. Esses jovens, além de receberem educação formal, também realizam suas principais refeições nas escolas públicas. Será que esses jovens e seus pais estariam dispostos a renunciar tal serviço em troca de um dia sem impostos?

 E o ensino público superior? Temos cerca de 1,3 milhão de alunos matriculados em estabelecimentos públicos de ensino superior, sendo que a maioria desses estabelecimentos estão entre os mais bem avaliados pela comunidade acadêmica.

 Será que esses futuros profissionais de nível superior estão dispostos a colocar em risco o funcionamento da instituição de ensino superior em que estudam gratuitamente, em troca de um desconto temporário nos produtos e serviços que consomem?

 Agora falaremos da segurança pública no dia sem impostos. Atualmente, cerca de 500 mil policiais civis, militares e bombeiros se encontram na ativa, garantindo a segurança do cidadão brasileiro. Sem mencionar as centenas de corporações de guardas municipais espalhadas pelo país, e ainda, a polícia penal, responsável pela guarda dos cerca de 700 mil presos acolhidos nas penitenciárias brasileiras.

 Será que abrir mão da máquina de segurança pública por um dia sem pagar impostos não iria comprometer sua integridade física, seu patrimônio ou até mesmo a sua vida? Você teria coragem de sair de casa nesse dia?

 E o que dizer da saúde? Cerca de 95% dos transplantes de órgãos realizados no Brasil são pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Sim, aquele mesmo sistema que bancou a aplicação de 509 milhões de doses de vacinas durante a pandemia da Covid-19. Estamos falando de um serviço público universal de saúde que atende a todos que se encontram no território nacional, especialmente os mais carentes.

 Valeria a pena, então, trocar um dia sem impostos por um dia sem UTI’s, Samu’s, unidades de saúde, atendimentos e cirurgias de urgência e emergência? Há possibilidade de estimar quantos morreriam nesse dia e se o total de “desconto” recebido pelo consumo de produtos e serviços sem impostos compensaria tais mortes?

  Então, antes de aderir a um "dia sem impostos", em protesto a alta carga tributária brasileira, pare e reflita sobre todas as áreas da sociedade que são afetadas com o não pagamento de impostos, e o impacto que isso representaria, ante a igual supressão de recursos que garantem o mínimo de bem-estar social ao cidadão.

 Não é porque a questão da carga tributária no Brasil seja irrelevante,  mas sim porque o “dia sem impostos” trata um problema complexo e profundo de uma forma rasa e hipócrita.

 Comparando o Brasil com outros países membros da OCDE, a sua posição no ranking de cargas tributárias não é tão alarmante quanto se propaga. 

O Brasil ocuparia a 17ª posição, com uma carga tributária de 33,4%, praticamente em linha com a média de 33,6% de países considerados potências mundiais. 

Isso nos leva a refletir que a ideia de um "dia sem impostos", desconsidera solenemente desafios estruturais que precisam ser enfrentados.

 A discussão sobre a carga tributária brasileira deve ser acompanhada de uma análise mais abrangente do sistema como um todo, considerando institutos preciosos da tributação, tiais como: a progressividade, a neutralidade e a simplicidade; que são elementos essenciais para qualquer sistema tributário que busca ser justo e solidário.

 A progressividade é fundamental para garantir que aqueles com maior capacidade contributiva paguem uma parcela justa de impostos, enquanto aqueles com menor renda sejam aliviados do peso excessivo. Isso implica que a carga tributária seja distribuída de maneira equilibrada entre os diferentes segmentos da sociedade, levando em consideração a capacidade de pagamento de cada um. 

 A neutralidade é outro princípio importante, pois busca evitar distorções econômicas decorrentes de um sistema tributário complexo e ineficiente. Um sistema tributário neutro permite que as forças do mercado operem de forma eficiente, sem interferências desnecessárias causadas por incentivos fiscais distorcidos ou tratamentos anti-isonômicos.

 A simplicidade, que no atual sistema é sabidamente negligenciada, é fundamental para promover a transparência e facilitar o cumprimento das obrigações fiscais. Um sistema tributário simples reduz a burocracia e os custos de conformidade, tornando o processo mais acessível para todos os contribuintes.

 Portanto, em vez de nos dedicarmos a apenas um dia sem impostos, precisamos promover um amplo e consistente debate sobre a reforma do sistema tributário brasileiro. Essa reforma deve visar menos a diminuição da carga tributária, e focar intensamente na efetivação dos principios da progressividade, neutralidade e simplicidade do futuro sistema que queremos adotar.

Um dia sem Estado, é dia de caos. Um dia sem impostos, é dia de ilusão.

 

segunda-feira, 8 de maio de 2023

B.I. não é A.I., e vice versa

Na semana passada uma série de matérias jornalísticas divulgaram o uso da tecnologia da informação por parte da Secretaria da Economia do Estado de Goiás, no controle de mercadorias em trânsito e combate à sonegação fiscal, informando que o sistema utilizado se baseia em inteligência artificial (A.I.). 

Outrossim, para quem não é leigo na área de tecnologia, é fácil constatar que o sistema divulgado na imprensa se trata na verdade de uma ferramenta de inteligência de negócios (B.I.) que se baseia exclusivamente em regras de negócios buscando a comparação de uma base de dados com outra.


O próprio software utilizado pela Secretaria da Economia goiana no divulgado sistema, “Power B.I.” da Microsoft, que "roda" com linguagem “DAX” e “M” na manipulação de bases de dados e construção dashboards, deixa claro que se trata de uma ferramenta de B.I. 


Nos últimos anos, temos visto um grande avanço no desenvolvimento de tecnologias que utilizam inteligência artificial (A.I.) para solucionar problemas complexos em diversas áreas, como saúde, finanças e até mesmo na fiscalização tributária. No entanto, para os leigos, é fácil confundi-los sobre A.I. e B.I., que são conceitos diferentes e possuem aplicações distintas.


B.I. é um conjunto de técnicas e ferramentas que visam transformar dados brutos em informações úteis e relevantes para o negócio, possibilitando a tomada de decisões mais assertivas. A ideia é analisar as informações coletadas e transformá-las em insights para auxiliar na gestão do respectivo negócio ou atividade. Tal técnica é baseada em regras de negócios pré-definidas, confrontando-as com bases de dados históricos.


Há mais de uma década o fisco goiano utiliza-se do B.I. para fins de fiscalização de tributos, especialmente por meio da ferramenta “SAP Business Objects”, mais conhecido no meio fazendário como B.O., que da mesma forma que o Power B.I, também manipula base de dados e constrói dashboards.


Lado outro, A.I. é uma área da computação que se dedica a desenvolver algoritmos capazes de aprender e executar tarefas que normalmente exigiriam inteligência humana. A inteligência artificial usa técnicas de aprendizado de máquina, redes neurais e processamento de linguagem natural para identificar padrões e gerar insights em dados complexos. Ela é capaz de analisar grandes volumes de dados em tempo real e tomar decisões baseadas em probabilidades, com um detalhe importantíssimo: sem precisar de intervenção humana.


Assim, a utilização da A.I. requer muito mais investimento, uma vez que envolve modelagem de dados, desenvolvimento de algoritmos e uma equipe de especialistas para garantir a eficácia dos sistemas, enquanto que o B.I. é ferramenta tecnológica mais acessível que ajuda a otimizar processos e analisar dados.


No caso específico do sistema de controle fiscal de mercadorias em trânsito divulgado pela Secretaria de Economia de Goiás, é importante destacar que, até o momento, a ferramenta não se baseia em A.Í., mas sim em B.I., para comparar uma base de dados com outras e detectar possíveis fraudes e sonegações fiscais. Embora o sistema possa ser eficiente naquilo que se propõe, não é correto chamá-lo de A.I. já que não há aprendizado de máquina nem uso de técnicas avançadas de processamento de dados, e ainda, por necessitar da constante intervenção humana.



A deliberada confusão entre A.I. e B.I. pode trazer consequências negativas, pois a falta de informação acaba servindo para promover tecnologias que não são realmente inovadoras ou disruptivas. Isso pode gerar desconfiança do público especializado em relação às tecnologias utilizadas e diminuir a sua adesão em soluções que poderiam trazer benefícios reais. 


Infelizmente, tem sido comum que organizações públicas e privadas que utilizam ferramentas de B.I. para analisar dados de suas operações e negócios se referirem a isso como A.I., com o ladino fim de transmitir a ideia de modernidade e inovação, quando na verdade estão aplicando regras de negócios e análise de dados da forma mais convencional possível.



O fato é que tal comportamento pode trazer sérios problemas de reputação e credibilidade, especialmente às instituições públicas, já que um princípio basilar desse tipo de organização é a transparência, inclusive quanto às tecnologias utilizadas, evitando-se assim questionamentos éticos, pois tal comportamento pode ser interpretado como manipulação da verdade.


Ademais, a desinformação e a falta de transparência no  uso de tecnologias pode levar a investimentos desnecessários em soluções inadequadas para resolver problemas específicos. É importante que o público interno e externo estejam cientes das diferenças entre as tecnologias utilizadas para poderem aplicá-las de maneira consciente e obter os resultados esperados.


Em resumo, é salutar fornecer a informação correta de forma transparente para que o público possa avaliar e concluir se determinada tecnologia é realmente inovadora e útil.


Afinal, informação sem credibilidade não resolve.