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  • Por que protegemos um sistema que nos fere?

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terça-feira, 23 de agosto de 2022

Exames médicos periódicos obrigatórios ofendem a intimidade e privacidade do servidor, decide TJ/GO.

 


   

Em maio de 2018, no julgamento do Mandado de Segurança n° 5079856.72.2018.8.09.0000,  impetrado pelo SINDIFISCO/GO, os integrantes da Terceira Turma Julgadora da Segunda Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por unanimidade de votos, confirmaram liminar deferida anteriormente, concedendo definitivamente a segurança pleiteada, que reconhece o direito líquido e certo dos filiados à entidade sindical impetrante de não se submeterem aos exames médicos periódicos previstos na Lei estadual n° 19.145/2015.


    Os desembargadores entenderam que a submissão dos servidores à exames periódicos não se mostra razoável, uma vez que obriga o colaborador a realizar conduta estranha às suas atribuições, com violação de direitos inerentes à intimidade, privacidade e autonomia, ofendendo diretamente ao princípio constitucional constante no inciso X, do art. 5º, da Constituição Federal.


    Em seu voto o desembargador relator destacou que: “impor aos servidores a submissão à procedimentos não consentidos, ainda que preventivos, nos quais devem expor, mediante o preenchimento de anamnese, informações de sua vida íntima e privada, aliadas à imposição de consultas e exames médicos periódicos, viola princípios individuais”.


    A norma declarada ilegal pela justiça goiana coage os servidores a participarem dos procedimentos de avaliação médica periódica sob ameaça de imposição de pena disciplinar àqueles que não se curvarem à ordem, conforme orientação contida no Parecer 2621/2016 e Despacho AG n° 3393/2016 da PGE, que reafirmam o entendimento da administração da natureza obrigatória dos exames, bem como da tese de que a sua não realização constitui falta grave apenada com suspensão.


    Apesar de a decisão ter transitado em julgado no ano de 2018, o assunto voltou à tona neste mês de agosto de 2022, após a divulgação da  Portaria 174/2022 e do Ofício Circular n. 241/2022-ECONOMIA, onde a pasta fazendária informa sobre o início dos exames médicos periódicos no âmbito fazendário.


    O SINDIFISCO/GO já encaminhou ofício à titular da pasta repisando a decisão que favorece seus filiados, solicitando que a pasta da Economia se abstenha de exigir a realização dos exames médicos periódicos aos filiados a entidade sindical, conforme determinado na decisão judicial.



domingo, 27 de março de 2022

ITCD: faltou coragem de desburocratizar

Sob a justificativa da desburocratização, a nova sistemática de fiscalização e cobrança do imposto causa mortis goiano, o ITCD, deu ao estado a faculdade de decidir, caso a caso, qual a modalidade de lançamento tributário mais conveniente a ser aplicada para o mesmo fato gerador em uma mesma circunstância.

O “modus operandi” do novo ITCD, permite que algoritmos separem em duas partes contribuintes que se encontram em situação tributária absolutamente idêntica, possibilitando que uma parte desses contribuintes recolha o tributo de forma “quase” automática, submetendo a parte restante a um tratamento fiscal mais rigoroso. Nesse caso, pelo simples fato do valor declarado como base de cálculo ultrapassar determinado teto que a administração tributária considera interessante (falam em R$ 800 mil). Esse é o critério que será preponderantemente utilizado nas malhas fiscais, que foca em conteúdo econômico e não em irregularidades.


A nova sistemática do ITCD goiano também vai provocar um efeito curioso, pois, em tese, com duas modalidades de lançamentos possíveis, o estado de Goiás passa a ter dois prazos decadenciais para o ITCD.  Difícil vai ser decidir qual dos prazos aplicar, uma vez que nem mesmo as autoridades fiscais do estado sabem, ao certo, a atual modalidade de lançamento do ITCD, se por declaração ou por homologação.


Assim, pluralidade de lançamentos, tratamento anti-isonômico e insegurança jurídica,  não são formas de “desburocratizar” tributos. Desburocratizar não significa dar solução cômoda, rápida e inócua para os problemas difíceis.


O problema do ITCD em Goiás, como tantos outros, ainda é a falta de investimentos.  Hoje, a estrutura física e humana disponível é incompatível com uma autêntica sistemática de lançamento por declaração. Aliás, é insuficiente até mesmo para manter essa nova sistemática “jaboticaba sabor pequi”, que alterna o lançamento por homologação com o por declaração, conforme conveniência da administração.


Não é a primeira vez que a gestão da pasta fazendária tenta agir de forma criativa, enquadrando a realidade em sua possibilidade, quando o correto seria o contrário.


Escolher a modalidade de lançamento do respectivo tributo é um direito da administração fazendária, mas no caso de Goiás faltou coragem à pasta da Economia em adotar a única modalidade de lançamento tributário viável ante as severas limitações materiais e humanas da máquina fazendária, que inexoravelmente acabam por repercutir no contribuinte.


Estou falando do lançamento por homologação, que dispensa qualquer participação da autoridade fiscal na constituição do crédito, cujo cálculo e pagamento fica inteiramente sob a responsabilidade do contribuinte, sem qualquer intervenção do fisco, que só pode agir caso identifique omissões após o prazo de pagamento do tributo, ou seja, nessa modalidade de lançamento não cabe o termo “quase”.


Para ter ideia da viabilidade do lançamento por homologação, na  maior fazenda pública estadual do país, São Paulo, o imposto causa mortis é lançado nessa modalidade. Pode não ser a melhor forma de  lançamento para o fisco, mas para a maioria dos estados é a modalidade possível e a mais justa e honesta para o contribuinte.


Ao introduzir o pagamento do ITCD “quase” automático, terminamos por “quase” desburocratizar esse tributo. Tenhamos coragem de fazer o que está ao nosso alcance, de forma correta e honesta com o contribuinte.


Em matéria de tributos, não existe “quase”.




sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

Presidente do TJGO suspende 11 liminares deferidas a empresas “noteiras”


Ontem (10) no início da noite, atendendo representação de contracautela da Coordenação do Agronegócio da Secretaria da Economia - Coagro, o Estado de Goiás conseguiu junto ao TJGO a suspensão de 11 liminares conferidas a empresas “noteiras” por juízes de 1º grau.

As noteiras operavam no mercado de commodities agrícolas, onde eram interpostas fraudulentamente em negócios de compra e venda de grãos, absorvendo a responsabilidade tributária pelo pagamento do ICMS devido nas respectivas operações, que por sua vez não era recolhido aos cofres públicos.

Ao identificar a fraude, o fisco implementava medida administrativa acautelatória, bloqueando a emissão de notas fiscais próprias da “noteira”, que por sua vez impetrava mandado de segurança alegando falsamente em juízo que o bloqueio se tratava de meio coercitivo de cobrança de tributos, obtendo a liminar, que passava a ser utilizada como uma espécie de alvará judicial para sonegar.

O prejuízo ao erário provocado pelas noteiras, entre maio/2020 a dezembro de 2021, foi calculado R$ 124,8 milhões, somente em valore originais do ICMS.

A representação da Coagro, requereu a suspensão de 16 liminares deferidas a empresas “noteiras”, porém 5 dessas liminares foram deferidas por Desembargadores do TJGO, circunstância que o Presidente do TJGO entendeu não ser de sua competência a decisão, que nesse caso é do Superior Tribunal de Justiça.

A PGE já foi acionada para ingressar com pedido semelhante junto ao STJ, visando suspender as liminares que ainda estão em vigor.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Prioridades da Receita em 2022

  O lançamento de ofício do crédito tributário é a mais elementar tarefa do fisco estadual, não havendo dúvidas de que o aprimoramento, investimento, preservação e facilitação do exercício de tal tarefa deve ser prioridade de qualquer administração tributária.

  No Estado de Goiás o lançamento de ofício do crédito tributário ocorre por meio do Auto de Infração Eletrônico (AIE), cujo respectivo módulo, acreditem,  só consegue “rodar” no navegador Internet Explore (IE). 

  Por ficar restrito a um único e ultrapassado módulo, a eficiência do lançamento de ofício acaba prejudicado, uma vez que dependente de um sistema que se tronou obsoleto em virtude da evolução tecnológica e transformação digital, cujas funcionalidades originais não mais correspondem com as novas dinâmicas de trabalho da organização.

  Assim, o que era para ser prioridade, hoje só funciona por conta de “gambiarras” de programação que impedem o colapso do sistema.

  Não fomos pegos de surpresa, pois a Microsoft comunicou a suspensão do Internet Explorer (IE) em janeiro de 2016, e desde o ano de 2018 a migração do módulo do auto de infração eletrônico (AIE) da Receita Estadual goiana é apontada pela área de tecnologia da pasta como prioridade. Todavia, quatro anos depois, nada ocorreu.

  Enquanto isso vimos outras demandas tecnológicas sendo  priorizadas em detrimento do AIE, a exemplo do aplicativo EON, e recentemente da implementação de um avançado sistema de reconhecimento facial, que irá controlar a entrada e saída de visitantes e servidores da Secretaria da Economia. 

  EON e reconhecimento biométrico tratam-se de inegáveis avanços. Todavia, nem de perto poderiam superar a prioridade atribuída à atualização do módulo do AIE, que alberga uma das mais importantes tarefas da fazenda, cujo eventual colapso traria prejuízo incalculável.

  A propósito, não é só o fisco que vem sofrendo diretamente com a obsolescência da tecnologia que lhe é disponibilizada, o contribuinte goiano também. Exemplo disso é a consulta à legislação tributária estadual (LTE) disponível no sítio de internet da pasta, cuja compilação e download só são realizados através do Internet Explore, ou seja, sofrem o mesmo mal. 

  Outro golpe é que o novo sistema operacional da Microsoft, o Windows 11, que nativamente já não reconhece o IE como navegador, fato que vai impedir que os usuários do AIE e da LTE se sirvam dos sistemas disponíveis quando seus computadores, curiosamente, se encontram devidamente atualizados.

  A pá de cal quem vai dar é a própria Microsoft, que anunciou recentemente que o antigo IE será definitivamente enterrado (morto já está) em 15 de junho de 2022. Isso ocorrendo, o problema vai ganhar contornos insuperáveis. 

  Se as prioridades da pasta não forem revistas, corremos o risco de sofrer um verdadeiro apagão no lançamento do crédito. O fisco vai parar, e dessa vez, por uma razão inédita e triste: pelo descaso.

  No mais, feliz ano novo!

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Conversa para boi dormir


       Na última quinta (25/11), com a derrubada do veto e republicação da Lei n. 21.077/2021, o Estado de Goiás declarou sua independência do sistema tributário nacional. Isso porque a citada lei alterou o Código Tributário estadual, onde, além de conceder um disfarçado perdão fiscal perto de R$ 1 bilhão, autorizou doravante que produtores rurais comercializem bovinos sem a emissão de nota fiscal.

A principal justificativa dos articuladores da referida lei é que a compra e venda de gado sem nota fiscal não traz prejuízo ao estado, uma vez que operações internas com tais semoventes são isentas do ICMS. Não é bem assim.

Emissão de documento fiscal é a mais elementar obrigação acessória do nosso sistema tributário. Serve não só para acompanhar operações tributadas, mas também para conferir a veracidade de operações declaradas como não tributadas, ou seja, identificar fraudes.

Lado outro, seja a operação isenta ou não, é através da emissão da respectiva nota fiscal que o estado calcula o valor agregado que vai definir o índice de participação de cada município goiano nos 25% que lhe cabem na partilha do ICMS.

Assim, a não emissão de nota fiscal é causa de descompasso no cálculo IPM, tirando recursos dos municípios pequenos e dando, ainda mais, aos maiores, especialmente no presente caso, uma vez que boa parte da população bovina goiana é abrigada pelos pequenos municípios.

Ademais, o imposto de renda da atividade rural é apurado anualmente por meio das notas fiscais emitidas pelo produtor no respectivo exercício. A falta de emissão do documento fiscal pelo produtor levará inexoravelmente à supressão desse tributo federal, onde perto de 50% do produto da arrecadação é retornado aos estados e aos municípios através do FPE, FPM e do Fundeb.

A propósito, os índices dos referidos fundos têm seu cálculo baseado em grande parte nas informações extraídas de notas fiscais regularmente emitidas. Então, quanto maior a omissão dessa obrigação acessória, menor o repasse ao respectivo ente da federação.

Assim, diferentemente do que pregaram os artífices da estrovenga legislativa que alijou a principal obrigação acessória do sistema tributário goiano, a referida lei causa prejuízo à União, aos 27 entes federados, aos 5.568 municípios brasileiros, e ainda, aos cerca de 50 milhões de estudantes matriculados no ensino básico.

O resto é conversa para boi dormir.