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segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Honorários em execução fiscal, verba particular somente a partir de onde interessa.




Encontra-se superada a discussão sobre o direito do advogado público aos honorários de sucumbência, assim entendido como sendo a parcela fixada em sentença pelo juiz a ser paga pelo vencido ao advogado do vencedor. O fundamento que dirimiu a controvérsia foi a festejada conclusão de que tal parcela constitui verba de natureza privada, não se confundindo com o crédito público, em especial o crédito tributário.

No Estado de Goiás o pagamento das sucumbências ao advogado público sob tal fundamento se trata de prática comum e antiga, sendo o montante recolhido direcionado à associação de classe desses servidores, que se encarrega de promover a distribuição da verba entre seus associados.

Outrossim, essa prática começa a fugir do razoável quando se constata que grande parte dos honorários pagos pelo contribuinte sobre dívidas fiscais são captados no âmbito administrativo durante renegociações de débitos tributários, que via de regra são concomitantes a generosos perdões fiscais cujo bojo traz considerável renúncia de receita; ou seja, essas dívidas são novadas ou pagas sob a perspectiva da grande vantagem econômica que representam, e não em razão da existência de eventuais execuções fiscais em curso.

Nessa senda, a renegociação de dívidas fiscais no âmbito  fazendário ocorre de forma integralmente divorciada de eventual ação judicial em curso, sem nenhuma interferência do respectivo procurador. Tal circunstância faz desaparecer a natureza sucumbencial da verba honorária não só pela inexistência da figura da ação judicial e sua sentença condenatória, mas também pela falta das personagens desse processo, quais sejam: advogado, vencido, vencedor e juiz; elementos esses indispensáveis para configuração jurídica dos honorários de sucumbência.

Contamina ainda mais a natureza sucumbencial da parcela recebida em ambiente administrativo a título de honorários, o fato de o advogado público ser servidor de carreira, estável e com remuneração fixa paga pelo erário justamente para desempenhar o papel de causídico dos interesses estatais; situação essa que afasta possível alegação do direito de retribuição do trabalho executado até a composição extrajudicial, que só poderia ser erguida no caso de advogados autônomos, sem vínculo empregatício com o respectivo cliente.

Tais circunstâncias, apesar de questionáveis, sempre foram relegadas a plano secundário pela Administração Tributária; pois, afinal, quem irá mesmo suportar o ônus da sucumbência indevida será o pobre do contribuinte, raciocínio esse que só fez a situação se agravar ao longo do tempo, gravando prejuízo não só ao pagador de impostos, mas a própria administração pública.

O descaso pelo tema chega a ser surrealista, ao ponto de atos normativos internos tornar factível no âmbito administrativo o pagamento dos honorários advocatícios sem que se proceda a quitação do próprio crédito tributário que lhe deu causa; e, ainda, tornando inexequível que ocorra o processo contrário, por força de várias “travas” incluídas na legislação tributária nesse sentido.

Exemplo cabal dessa assertiva reside no fato de que a parcela proclamada como “particular” e “inconfundível” com o crédito público, desavergonhadamente pega “carona” no ato de quitação do tributo cobrado, pois tem o valor da respectiva parcela providencialmente adicionado ao contexto financeiro do documento de arrecadação emitido pela fazenda pública; que ao final é repassado aos causídicos livre do peso das inevitáveis despesas bancárias e de administração oriundas do processo de cobrança administrativa, que correram integralmente por conta do erário, claro!

Tal imoralidade promete agora alcançar o seu apogeu, em razão de o programa de remissão fiscal atualmente em curso na pasta fazendária conter a previsão de quitação da dívida tributária através de créditos do ICMS acumulados na escrita fiscal do contribuinte ou recebidos em transferência; situação essa que inviabiliza a “carona” da verba particular no documento público de arrecadação pela simples prescindibilidade de sua emissão no caso concreto.

Para resolver o imbróglio, surgiu a genial ideia da criação de um documento - público - de arrecadação provisoriamente apelidado de DARE-HONORÁRIOS, que serviria exclusivamente para cobrar e abrigar a verba particular de nossos causídicos públicos, que seriam pagos pelo contribuinte à vista e em espécie através do referido documento, tudo isso às custas do Estado; que por sua vez terá seu direito creditício remido na mesma ocasião através do enfadonho encontro de contas, em total inversão às garantias e privilégios do crédito tributário.

Finalizando, apenas para contrapor a vergastada prática, mostra-se cogente apontar a existência de categoria de advogados públicos que se utilizam do famoso e simples “boleto” bancário, emitido às expensas de sua respectiva associação de classe para receber de forma digna e proba suas verbas particulares; com o registro do bom exemplo dos causídicos públicos dos Estados do Tocantins, que através da Portaria Conjunta n. 1.145/2014 resolveu a demanda de forma diversa da que vem ocorrendo no Estado de Goiás, com grifos nossos, a saber:

PORTARIA CONJUNTA SEFAZ/PGE Nº 1.145, de 01 de Dezembro de  2014.
Art. 4º O pagamento dos honorários advocatícios pode ser operado por meio de boleto bancário, transferência ou depósito identificado em nome do contribuinte devedor, creditado na conta bancária de titularidade da Associação dos Procuradores do Estado do Tocantins – APROETO, CNPJ: 00.269.036/0001-75, na Conta Corrente nº 56.451-6, Agência nº 1505-9 - Banco do Brasil S/A.
Parágrafo único: Para emissão do boleto bancário, o contribuinte deve acessar o site: WWW.APROETO.ORG.BR, no link “boletos”, preencher o formulário, imprimir e efetivar o pagamento na rede bancária.
Art. 5º Devido à modificação da natureza jurídica dos honorários advocatícios, de pública para privada, é vedado:
I - o parcelamento, conforme Resolução nº 02, de 04 de setembro de 2014, do Conselho de Procuradores do Estado do Tocantins.
II – o recolhimento por meio do Documento de Arrecadação de Receita Estadual – DARE;
III – a exigência de comprovação do pagamento quando da baixa do débito na dívida ativa.

No mais, ao que parece, a verba relativa aos honorários de sucumbência do advogado público em Goiás só se torna realmente privada quando termina a necessidade de sua cobrança. Até lá, o erário que se vire com o respectivo custo.

Goiânia/GO, outubro de 2017

Cláudio Modesto
Auditor-Fiscal
Diretor Jurídico do SINDIFISCO/GO